quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Música de Lágrimas




Saltas comigo?

Anda, dá-me a tua mão, nada temas, num canto oco sei que muito escondes, no outro canto cheio de vida tu sempre te revelas... há dentro de ti, assim como dentro de mim, a ânsia de ir, de ficar, de partir, de saltar.

Saltas comigo para este mar de letras?
Agora? Já? Saltas comigo?

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Queres Voar?


_Porque estás aos saltos em cima do banco? Não vês que parece mal! Sai já daí.

Maria sempre fora educada com rigidez e, apesar das chamadas da atenção dos seus familiares, era assim que gostava de educar também os seus filhos. Nunca entendia nenhuma brincadeira, raramente os deixava ser crianças nem tão pouco acreditava nesse conceito. Ao ver Simão assim aos pulos em cima do banco de jardim não pode conter a sua fúria, envergonhada, deixou seu filho embaraçado agarrado a nada, sentado apenas, de pernas cruzadas, mão esquerda segurando o queixo e a face lavada em lágrimas.

_ Então Simão? O que se passa?

Henrique, um tio que Simão gostaria de ter tido, o único capaz de o entender, às vezes aparecia quando não era bem vindo. Amigo imaginário? Talvez! Para Simão era seu único confidente, o seu conselheiro.

_ A mãe não entende aquilo que me pediste para fazer...

As lágrimas corriam-lhe rosto abaixo, umas atrás das outras, deliniando o caminho à frente das bochechas cabisbaixas, a boca senti o sal das lágrimas e um gosto amargo a cobrir os espaços em seu redor, o coração batia acelerado, às vezes descompassado mas nunca silencioso. Assim era Simão, um menino habituado às emoções, passional, cândido, pequena pedra no meio de um coral mas a pedra mais brilhante, a mais especial.

_ Há muitas coisas que deves entender Simão. Se a tua mãe não acredita no que te disse não tem mal, um dia há-de acreditar e então aí irás sorrir ao vê-la saltar ao teu lado em cima do banco de jardim.

Henrique tinha sempre as palavras certas para proferir mesmo quando o caos e a incerteza teimavam em habitar aquele coração pequenino.

_ Achas que ela um dia também vai conseguir?

_ De certeza que vai! Porque não? Achas que ela não será capaz?

_ Acho que ela não quer!

_ Não podemos obrigar ninguém a fazer aquilo que não quer. Quando ela quiser ela irá conseguir. Basta que acredite!

_ Henrique!?

_ Sim Simão!

_ Tu conseguiste logo na primeira tentativa?

_ Não! Voar é complicado até quando se é criança, ainda com o coração puro e limpo de preocupações.

_ Como voam os anjos então?

_ Já te havia dito antes. Eles conseguem voar porque não se preocupam! Tu não te deves preocupar com o facto de voares ou não, um dia saltas e as tuas asas de anjo se elevarão para te levar onde tu quiseres.

_ Sabes onde eu queria?

_ Não. Não sei!

_ Queria fazer um piquenique com a mãe em cima de uma nuvem.

_ Quem sabe um dia não a levas.

_ Sim, quem sabe!

A boca de Simão não conseguiu disfarçar o suspiro e o sorriso que o sucedeu. No seu pensamento a imagem de um piquenique perfeito, com os bolos caseiros da mãe, com o sumo natural de laranja, com o baralho de cartas e o papagaio que tanto gostava de lançar ao vento.
Saiu a correr, debaixo do braço o papagaio, à sua frente a rede do parque, lá em baixo, a mais de 25 metros o rio. Simão subiu a rede sem medo, destemido mirou o rio com a bravura de um super-herói, Henrique voava dali para ali dando instruções de voo, lá trás, debruçada sobre a toalha de piquenique Maria preparava as sandes de geleia, as preferidas de Simão.

_ Mãe! Mãe!

_ Que foi Simão?

_ Olha como eu sei voar!

Maria correu e correu e correu e à sua frente o verde da tenra erva parecia infinito, alcançando a rede viu o seu filho voar os 25 metros com o papagaio torneando ao vento, a água recebeu o corpo com aplausos salpicados, os olhos de Maria encheram-se de sal, de água, a face empalideceu, o corpo decaiu.





sábado, 23 de fevereiro de 2008

David e Golias *

Quero um charro, voar sobre o eco vadio e vadiar como um glaciar. Quando não estás por aqui e nem sabes onde está o mundo é mais fácil ligares a televisão e não ouvires o que te chega do outro lado. Penso se existo e logo me calo porque não sei se existo e a existência se resume à necessidade de vida. Há vida? Quero ser um glaciar! Poucas são as palavras que ainda me consigo ouvir a dizer, a voz que parte o espaço e o tempo é uma miséria. Quero um charro que abafe de uma vez esta tristeza, que apague este cheiro a alcóol. Fazes minhas as palavras que não entendo. Eu sou muito mas pela anestesia do ser pensante que ao ócio se entrega deleitosamente por preguiça. Sim, sou uma merda. Quero um charro. Duas baforadas só para ti e continuo. És uma merda também. Areia do mesmo saco. Barro do mesmo pote. A tua gravata não te melhora a retórica. Não importa o quanto com ela esganes a tua garganta. E a tua voz. É quase pena o que sinto deste cenário e de nós figurantes. Dá-me para retumbar na auto-mutilação espiritual.
Sabes o que penso da tua gravata prateada sob o fato negro? Miséria! Queres um charro também? Precisas de ouvir as calamidades que dizes, liga a televisão. Abafa o tempo que é teu por preguiça ou ócio a merda que for. Se quiseres apago as tuas pegadas pelo mundo não quero que restem dúvidas. Se quiseres, és um glaciar. Perfuma agora a tua raiva com um cheiro a verdade a rondar a distância. Sabes o que é a verdade? és um mendigo! Sabes o que eu sou? Um rei que quer um charro! Partilhamos? Duvido. Não partilho nada com quem arranca. Valeu pela temporária tentativa de sucumbir à altivez da tua poderosa negra magnificência. Mas eu sou o fraco do tabuleiro. Infelizmente não me posso reconduzir ás mesmas histórias de sempre. À mesma música que passa na rádio. Nem ao cicerone propagandista da novela das 5. O meu fumo é o meu reino. As minhas putas a que chamo sentimentos vão-se vendendo por pouco mas sem nunca se dar a ninguém. Por outras palavras: eu sou problema meu. Não das multinacionais. Pintamos a mesma tela mas com cores diferentes, eu pinto-a com os pés descalços e tu com uns sapatos de verniz quaisquer comprados numa loja de requinte. Julgaste requintado? Julgaste sabedor? Que sabes tu da vida afinal? Sou eu o Ulisses e tu és um suporte partido de toda a minha magnitude e força. És um vulto pertinente do que nunca foras, julgaste ser porque espalhas a verdade pela tua voz supérfula e eu com os pés descalços balanço nos braços da vida, os meus braços estão aquecidos pela minha verdade e os teus? Aquecidos pela tua mentira. Olha-te o reflexo nos charcos onde bebo? Qu'é de ti afinal? Qu'é da tua triste vida? Perdeste-a num jogo de poker onde achaste que não tinhas nada a perder. Só a gravata te faltava pôr na mesa, sabe-lo bem. A racionalidade é a tua mão favorita, sabemo-lo bem também, mas na hora da verdade, eu consigo fazer dela muito mais minha do que tu. Sou se quiser, na análise um glaciar mais frio do que aquele que tu és em vida. Mas ainda é a emoção que caminha os meus passos. Ainda sou eu que fumo a droga, não a droga que me fuma a mim. Não deixo ainda a vida passar-me ao lado em nome do grandioso nome de uma garrafa de whisky velho com muito alcóol, pelo seu colateral efeito de libertação.
Sabes o qu'é da minha vida? É tudo! Ainda sou eu que traço o meu rumo, balanço os meus pés descalços na verdade que tu choraste. E tu choras? Acredito que não chores: a emoção já te não ocupa o corpo nem os espaços em volta e o resto? A tua existência resume-se à ínfima verdade absurda... Ainda há verdade? Já gastaste tudo! Até o teu nome já está gasto nas esquinas do que pensas ser, o que de ti fica é a incorrecta persistência em querer ser algo mais que não o que a ti pertence. Fica-te pouco nas mãos, no final de contas. Bem vistas as coisas tens ainda menos do que eu, que tenho o meu lazer psicotrópico e a minha luxúria ocasional. Tal dá-me tempo para ser livre. As tuas letras bancárias não são senão empréstimos. Que sabes que terás de pagar e para os quais terás de pedir mais empréstimos. É um ciclo. É um jogo. Viciante e viciado. Quem é o drogado da história, então? Devias fumar do meu charro e menos do teu tabaco
Estou estoirado pelas balas que me lanças, no fim de contas fazem ricochete em mim e é a ti que matam. Queres partilhar o meu charro pá? Afinal qu'é da tua vida? Afinal qu'é dos teus limites? És um pobre descalço neste chão de renúncias que criaste. Vê lá onde pões os pés tens os pregos que te pregarão na cruz espalhados pelo teu chão. são tantos! Aqui não há espaço para os teus queixumes de rico desgraçado, não há espaço para filhinhos da mãe, só há espaço para filhos da puta.
Fumas?
Sangrarás por redenção com os pregos do teu ódio que te prendem ao chão. Rezarás e desperarás por uma coroa de espinhos que te faça rei. E senhor. Implorarás aos espectadores, inclusive para ressuscitar ao 3º dia a fim de poderem votar em ti para umas próxima eleições. Vale tudo, tudo, tudo para a construção de um novo império, uma revolução, uma nova ordem mundial, ainda que tudo o seja à escala regional de uma freguesia ou uma aldeia. Tu, cara a cara com o meu fumo, dizes-me um sorriso rasgado com uma palmadinha no ombro. Mas eu bem sei da faca que seguras por detrás das costas. É tudo apenas mera propaganda, 'amigo'.
És Judas! Enforca-te! Faça-se assim a Tua vontade. Seu Traidor de meia-tijela. Dás-me um beijo? Que beijo é esse? A redenção? O perdão? "Perdoai-lhes Senhor porque não sabem o que fazem!"... queres que te acene? Tenho mais o que fazer. Já superei os meus limites e as minhas sombras, já me cansei da tua presunção e das tuas manias. És um infiel, um traidor! Maldito! És a merda que condenas! Nos media! Na praça pública! Aos sete ventos! Na tua casa de classe média! No teu salão de tertúlia na Foz! No tasco da tua aldeia quando vais falar de bola e de gajas! Quando apanhas a tua bebedeira para te sentires um ser humano! Quando ajudas a puta da Cruz Vermelha, para desviares os seus fundos à primeira oportunidade! Na ironia com que te ris dos teus e dos que gozam contigo amaldiçoando entredentes a democracia que te impede de os aniquilar! Mas suspiras interiormente. Sabes perfeitamente que os fins justificam os meios, e meios não faltam para a estrada que pretendes trilhar pela portagem mais cara. A tudo isso, eu vejo. Perante todo tu, eu estaco. Fumo. Revolto-me. E aponto. Sei, como o sabe, quem sabe de História, que todas semelhantes hipocrisias terão um dia de acabar.
E findo este canto ás paredes de todas as almas, até da tua!, depois francamente seguro de novo o copo entre as mãos e olho o cinzeiro onde repousa o meu restinho de charro. Está para acabar este meu estado absurdo mas inteligente de ser. Está para acabar e já sinto falta dele, até no ar o fumo quase se evapora mas eu continuo fiel ao que sinto e penso, fiel ao meu dono, cão vadio abandonado na rua. O Bom Filho à casa torna. Adormecem-me as mãos... adormecem-me os sentimentos e as pálpebras quase se fecham enquanto oiço ao longe a magnitude de todos os limites sãos. Bato palmas ao teu ódio enquanto se me esquecem os gestos. Berro os meus dissabores e solto os meus uivos à lua dos teus desejos já saciados. Quero-me de volta! A mim e aos meus!
O baú da memória encerrará o restante.






* escrito pelas minhas mãos e pelas mãos do Street Fighting Man, pode encontrar textos dele em http://umbrellameansfreedom.blogspot.com

Saudade de um Portugal

Abro a janela e respiro um ar qualquer que não me motiva, fecho os olhos e antes que me cheguem às narinas os cheiros do mar exalto a luz dos meus olhos sobre a cidade que se agita na minha frente, ocupo o espaço com os pedaços de vida que ainda te sobram.
Onde foste Portugal? Levei-te a sair por aí com o meu coração afinado e nem uma nota tocaste do teu verdadeiro fado. Qu'é de ti Portugal pequenino, país à beira mar plantado? Onde estão as tuas vozes? Fechadas na escumalha que se deita no teu chão? Onde estão os teus sentidos? Perdes-te? Onde? No chão que aos teus olhos piso sem saber uma direcção, um rumo. Um barco contra o cais, miséria a vir e a ir, balançando nos sonhos de quem sabe que não és tu isto, nunca io foste, indo e vindo como o mar que te banha aqui neste canto tão teu que não sei porque não o entendes se é o único que te pertence. Deixa-o vir sobre ti, cair em ti como se fosse por ele que esperasses. Deixa-o só porque estás trilhado pela solidão demasiado vaga dos dias. Oh Portugal, Portugal!
Saudade de um Portugal, aquele que ali longe ainda canta o fado pela voz lusitana, aquele que deixa ainda o cheiro a mar preencher as suas ruas, aquele portugal que guardo só nos meus olhos fixos no eco vagabundo de um céu que me pertence como me pertencem os passos sempre seguindo numa única direcção, a tua.
Saudade que marca a fé que ainda tenho pelo meu Portugal.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

na noite passada





Na noite passada mandei-te um beijo,
não o apanhaste,
fui apanhá-lo ao Tejo,
adormeci embalada pelos teus olhos
mas de não tê-los não me chegaram os sonhos,
corri em vão nas escadas do teu ser,
chorei depois a verdade de te não ter.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Pluma


Por onde andas?

Onde o vento te leva?

Quando o teu caminho se cruzará de novo com o meu?

Dás-me um sinal?

Faz-me cócegas no rosto e cai nos meus braços.

Quero-te ainda... sempre!

sábado, 9 de fevereiro de 2008

Letras Soltas


A dada altura já não me interessa qual foi o teu caminho ou qual foi o meu, porque não nos cruzamos ainda ou porque esta vida ainda não nos colocou no mesmo caminho, a dada altura só penso no amor que sentimos e isso me enche o peito de ar puro. Lacrimejante ainda sinto o meu coração pulsar com as tuas imagens, meras recordações de outras vidas.
, saltos sobre o azul disperso de um mar eterno de amor, pulos sobre o pote de ouro no fundo do arco-íris, ouro sobre o azul? Sim, porque não?!
Creio que foi o teu sorriso cativante ou então as mãos, as mãos de quem já sabe de cor o meu toque sem, no entanto, nunca me ter tocado, as mãos de um caçador de estrelas, de um acendedor de candeeiros, de um iluminador de vidas. Creio que, no fundo, foi tudo, foi um mundo inteiro, perfeito, único, foi tudo isso que nos fez de repente ganhar asas e voar sobre as nossas vidas passadas, de mãos dadas com o pôr-do-sol e com o azul do céu, descobrir por fim a plenitude do sentir, o ritmo acelerado de dois corações que batem em uníssono.
Que esta carta seja uma prece, uma voz que se eleva em silêncio por cima do barulho que se impõe, uma prece por ti, por mim mas, sobretudo, por nós, porque muito temos ainda por viver embora nos pareça impossível.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Última Carta

Tentei escrever-te esta noite para que não restassem dúvidas, amar-te pode ser sinal de tudo ou pode ser sinal de nada, um olhar trespassado é quase idêntico a um olhar equivocado, se me amas sê gentil comigo e contigo próprio e entende que não sei porque o sinto mas que sinto a ânsia de algo mais, mesmo tendo-te a meu lado. As tréguas estão lançadas, o baralho está por partir, é a tua vez, fá-lo por mim, só preciso que me sejas forte o suficiente para me corrigir se estiver errada ou fraco o aceitável para me convenceres a permanecer na tua vida.
Pode parecer egoísta querer que a Primavera aconteça só na minha varanda, sem ter com quem partilhas as flores, mas não o é, se pensares bem descobrirás que a Primavera acontece mais dentro do coração do que fora do corpo, se pensares bem descobrirás que as tuas flores por mim murcharam e que já não existe Primavera na nossa varanda, não estamos na estação errada, o tempo não se apressou nem recuou, a vida é simplesmente composta pela irremediável mudança.
É difícil fazer as malas e abandonar-te, por isso, por ser assim tão fraca, preciso que as faças tu por mim e que saias tu da minha vida, pela porta da minha casa. É inaceitável considerar que depois de tanto tempo o amor estagnou mas acontece, um raiar íntimo, inteiro e uno fez com que despertasse em mim a eterna necessidade de sentir, viver, agir, como se a diferença e a aventuras fossem as minhas práticas diárias.
Gosto de ti, não o poderia negar, nem nunca o negarei, dizer que és demais para mim é uma hipérbole, chamar-te bonito é patético, dizer que me cativas é eufemismo mas isso só não chega. Como eu gostava que chegasse! Como eu gostava de acenar a bandeira branca da paz a este impulso tão verdadeiro, tão real, tão assustador que nem me consigo conformar, confortar, não consigo sequer sentir o meu coração bater-me no peito.
É assim, este é o fim, um adeus não seria justo mas um até sempre nunca é demais...

Sabes onde eu estou, ao alcance de um ou dois passos apenas, sentada na cadeira ao lado.